Poema é coisa fina,
Daquelas que se toca de latex e
Monóculo,
Pedra preciosa, Jade Rubi
Diamante
Ouro de sem quilates
Prata fora-da-lei.
Poema é sacrossanto,
Herança dos deuses aos
Homens,
Sopro divino, bafo de vino.
Poema é
Merda bem-cheirosa
Flora selvagem a crescer em
Estrume, sol, mar, céu,
Noite, vida e
Fossa séptica.
Poema é história maior
Sem conclusão
Ponto final.
Novembro de 2009.
eu só existo porque incompleto. se me esquecer de mim inteiro, morro. se me esquecer de me terminar, morro. se parar, morro. eu só sou porque incompleto. a minha vida é construção eterna.
eu nunca hei-de ler os gregos.
nunca lhes vou comer a carne.
nem a homero nem a sofocles.
os gregos não são de ler –
comer, absorver, beber –
os gregos não são para ler.
e os vis romanos,
não me fales dos homens do lácio,
corajosos cobardes.
eu nunca hei-de ler os latinos –
comer, absorver, beber –
já sofro com o português
que lhes herdei.
eu nunca hei-de ler os gregos.
eu nunca hei-de ler os gregos.
eu nunca hei-de ler os gregos.
eu nunca hei-de ler os gregos
a não ser em tudo o que
ler
conclusões do mundo real #1
22/06/2009
a burocracia é um mal desnecessário sem o qual não se consegue viver.
considere-se um mundo com um homem no centro. considere-se que não se trata de um homem qualquer mas de um humanista puro. considere-se este um homem perfeito. considere-se que não há conflito semântico entre os vocábulos homem e perfeito – ou seja, ignore-se a antítese. ignorando a antítese é-se forçado, consequentemente, a ignorar todos os lexemas com significado, ainda que remotamente, ligados ao conceito de posições opostas. ignore-se, portanto, as palavras oxímoro, antónimo, desavença, conflito. poder-se-ia forçar o esquecimento da guerra e seus sinónimos. assim seja. consequência: este homem no centro do mundo, sendo perfeito, aperfeiçoou-o. de repente, um mundo antropocêntrico deixou de ser uma ideia renascentista, logo, arcaica. missão: encontrar o homem perfeito. matá-lo.
investigações. tavares #2
18/06/2009
não sei concentrar-me. não sei onde me devo focar, a que distância devo manter-me para ser o mundo. se me colo ao teclado vejo todo o teclado, pormenores de fabrico, defeitos de letra (tenho um m perneta e já não sei qual é o i o j ou o l) mas todo o quarto me passa ao lado. se me afasto do teclado percebo todo o compartimento, sei o que me rodeia, a que altura está o tecto de me cair, quantas paredes tem o quarto (quatro, tem quatro paredes) – oposição, perco o pormenor do erro. nada tão interessante como o erro. nada tão interessante quanto tudo.
o meio termo não existe.
investigações. tavares #1
18/06/2009
é preciso calma, pergunto.
a resignação é mal vista.
é necessário medo.
é necessário o medo.
é essencial não te curvares.
é vital não te curvares.
pensamento erguido, caminha de costas.
de frente com o medo.